003- Espiritismo: Ciência, Filosofia e Religião

I - INTRODUÇÃO:

Embora represente uma face do Espiritualismo, cumpre esclarecer que o Espiritismo difere de toda e qualquer ramificação espiritualista religiosa, na medida em que não possui "dogmas" propriamente ditos, mas antes fundamenta-se na razão e nos fatos. Sob esse aspecto o Espiritismo é considerado uma Doutrina Tríplice, pois sua estrutura consiste em Ciência, Filosofia e Religião.

Ciência, pois possui como fundamento a parte experimental ou seja, idéias organizadas sistematicamente a partir dos fatos, dos fenômenos mediúnicos, das manifestações em geral. Para tanto, emprega, efetivamente, o método experimental.

Filosofia, pois a sua temática abrange essencialmente objetos de conhecimento que estão além da experiência sensível, qual: a existência de Deus, os Príncipios constitutivos do Universo (Causas Primárias), as Leis Morais e outros. Para tanto, possui como instrumento seguro o método racional.

Religião, na medida em que seu fim último consiste na restauração do Evangelho e na prática dos príncipios cristãos. Importa porém considerar que, embora de essência religiosa, o Espiritismo não se vale de formalismos exteriores, de práticas sagradas, rituais ou técnicas coletivas, mas a busca de religiosidade dá-se na intimidade afetiva de cada um, a partir de uma atitude interior consciente.

Estes três aspectos encontram-se bem definidos na Codificação de Allan Kardec, respectivamente:

A - Ciência: no O Livro dos Médiuns. B - Filosofia: no O Livro dos Espíritos. C - Religião: no O Evangelho Segundo o Espiritismo.

Em seus aspectos científicos e filosóficos, a Doutrina será sempre um campo de investigações humanas. No aspecto religioso, todavia, repousa a sua grandeza divina, por constituir a restauração do Evangelho de Jesus Cristo, estabelecendo a renovação definitiva do homem para a grandeza de seu imenso futuro espiritual.

O LIVRO DOS ESPÍRITOS - INTRODUÇÃO I e VII.

II - ESPIRITISMO COMO CIÊNCIA:

O Espiritismo é uma ciência cujo fim é a demonstração experimental da EXISTÊNCIA DA ALMA e sua IMORTALIDADE, por meio de comunicações com aqueles aos quais impropriamente têm sido chamados mortos. Há quase meio século foram empreendidas as primeiras investigações sobre este assunto; homens de ciência da mais alta notoriedade consagraram longos anos de estudos para certificar os fatos que formam a base desta doutrina, e foram unânimes em afirmar a autenticidade dos fenômenos que pareciam produto da superstição e do fanatismo.

Na França, conheciam-se imperfeitamente essas pesquisas, de sorte que, aos olhos do grande público, o Espiritismo não passava de farsa de mesas girantes. Contudo, o tempo desempenhou o seu papel, e essa doutrina apresenta hoje ao experimentador imparcial uma série de experiências rigorosas, metodicamente conduzidas, que provam, com segurança, a sobrevivência do "eu" humano à desagregação corporal.

São esses fatos que queremos expor, a fim de que eles implantem em todas as consciências a convicção da imortalidade, não mais baseada somente na fé ou no raciocínio, mas solidamente firmada na Ciência e no seu método severo e positivo. A geração atual está fatigada de especulações metafísicas; recusa crer naquilo que não está absolutamente demonstrado, e, se o movimento espírita, que já conta milhões de adeptos no mundo inteiro, não ocupou ainda o primeiro lugar, deve-se isso a que seus adeptos negligenciaram, até então, por sob os olhos do público fatos bem averiguados.

A maior parte das publicações periódicas contém comunicações de Espíritos, as quais podem ser interessantes sob certos ponto de vista; todavia, como sua autenticidade não está absolutamente provada, não produzem o efeito desejado. As obras francesas aparecidas desde Allan Kardec sobre este assunto são repetições, com exceção dos livros de Eugène Nus, Louis Gardy e Dr. Gibier, ou, então, não apresentam originalidade alguma sobre a questão, de modo que o movimento tem sido retardado. É preciso que se lhe dê novo impulso. Para tal, é mister caminhar com o século e saber curvar-se às necessidades da época.

O materialismo triunfa por toda a parte, mas já se pressente ser de pouca duração o seu reinado; basta servirmo-nos de suas próprias armas e combatê-lo em seu próprio terreno. A escola positivista encerra-se na experimentação; imitemo-la; nenhuma necessidade temos de apelar para outros métodos, porque os fatos são obstinados, como diz o sábio Alfred Russel Wallace, e deles não é fácil desembaraçar-se.

Em vez de apesentar aos incrédulos toda a doutrina formulada pelos Espíritos e codificada por Allan Kardec, demos-lhes, simplesmente a ler os trabalhos de mestre, como Robert Hare, Crookes, Wallace, Oxon, Zollner, Aksakof, pois que não poderão recusar os testemunhos desses grandes homens, que são, por títulos diversos, sumidades intelectuais no vasto domínio das ciências. Não esqueçamos que Crookes fez a Física dar um passo gigantesco com a demonstração do estado radiante. Wallace é, com certeza, neste momento o primeiro naturalista do mundo, pois, ao mesmo tempo que Darwin, achou e formulou a Lei da Evolução. Os trabalhos de Zollner, em Astronomia, são universalmente conhecidos; os de Fechner, sobre a sensibilidade, são ensinados em toda parte; e, quanto aos professores Mapes, Robert Hare, temos a dizer que eles gozam de indiscutível autoridade na América do Norte.

Eis aí os principais campeões do Espiritismo; é tempo de reagir contra os bonzos oficiais que tentam abafar as verdades novas, afetando uma desdenhosa indiferença. Se temos respeito e admiração pela Ciência sem prevenções, pela que imparcialmente encara todos os fenômenos, estuda-os e explica-os friamente, fornecendo boas razões, também nos sentimos cheios de indignação contra a falsa ciência, rebelde a todas as novidades, encerrada em convicções adquiridas e crendo, orgulhosamente, ter atingido a meta do saber humano.

Foram homens desta classe, diremos como Wallace, que fizeram oposição a Galileu, a Harvey, a Jenner; foram esses ridículos teimosos que repeliram a maravilhosa teoria das ondulações luminosas de Young; que zombaram de Stephenson, quando este quis correr locomotivas sobre as linhas férreas de Liverpool e Manchester. Atiraram todos os sarcasmos possíveis contra a iluminação a gás, e repeliram Arago na próprio seio da Academia, quando este quis discutir a telegrafia; seres ignaros que classificaram o magnetismo como embuste e charlatanice, e que, ainda ultimamente, qualificaram de grande peta a descoberta do telefone.

Não foi por vão prazer de mostrar quanto o espírito humano, mesmo nas classes mais esclarecidas, está sujeito ao erro, que citamos alguns dos mais frisantes exemplos de obstinação nas corporações sábias e o seu horror pelas novidades. Nosso intuito é suscitar um sério movimento em prol dessas investigações, que têm considerável alcance, tanto no domínio material quanto no domínio psicológico. Se realmente a alma não morre e pode agir sobre a matéria, achamo-nos em face de forças desconhecidas, cujo estudo é interessante; pela mesma forma verificaremos modos novos de energia, que podem conduzir-nos a resultados grandiosos; o mesmo sucede com a personalidade, que, conservando-se depois da morte, nos pôs em presença de um outro problema: a produção do pensamento sem os órgãos materiais do cérebro.

Deixemos de parte os rotineiros obstinadamente encerrados em seus sistemas, abramos bem os nossos olhos quando homens probos, sábios e imparciais nos falem de recentes descobertas, e fechemos os ouvidos ao alarido de todos os eunucos do pensamento, impotentes para saírem da órbita das idéias preconcebidas. Diremos com um sábio que não teme desviar-se dos caminhos trilhados, o Sr. Charles Richet, que uma boa e completa experiência vale por cem observações, e acrescentaremos: vale dez mil negações, ainda mesmo quando essas negações emanassem de sumidades da maior notoriedade, se estas não se dignassem repetir as experiências e demonstrar-lhes a falsidade.

Este simples resumo não tem outras pretensões além da de expor aos olhos do público as experiências feitas por homens eminentes, por mestres nesta arte tão difícil da observação exata; resultará disso a prova evidente da imortalidade do ser pensante, porque ela afirmar-se-á cada vez mais nitida, cada vez mais evidente, à medida que se desenvolver o magnífico encadeamento dos fenômenos, desde o movimento das mesas até as aparições visíveis, tangíveis e fotografias dos Espíritos.

O Fenômeno Espírita - Gabriel Delanne