14 - As cruzadas e o fim da Idade Média

AS PRIMEIRAS CRUZADAS. Reportando-nos ao século XI, as Cruzadas nos merecem especial referência, dados os seus movimentos, característicos da época. Desde Constantino que os lugares santos da Palestina haviam adquirido considerável importância para a Europa ocidental. Milhares de peregrinos visitavam anualmente a paisagem triste de Jerusalém, identificando os caminhos da Paixão de Jesus, ou os traços da vida dos Apóstolos.

Enquanto dominavam na região os árabes de Bagdá ou do Egito, as correntes do turismo católico podiam buscar, sem receio, as paragens sagradas; mas a Jerusalém do século XI havia caído sob o poder dos turcos, que não mais toleraram a presença de cristãos, expulsando-os dali com a máxima crueldade. Semelhantes medidas provocam os protestos de todo o mundo católico do Ocidente e, no fim do referido século, preparam-se as primeiras cruzadas em busca da vitória contra o infiel.

A primeira expedição que saiu dos centros mais civilizados, sob o comando de Pedro, o Eremita, não chegou a ausentar-se da Europa, dispersada que foi pelos búlgaros e húngaros. Todavia, em 1096, Godofredo de Bouillon com seus irmãos e Trancredo de Siracusa e outros chefes, depois de se reunirem em Constantinopla, demandaram Nicéia, com um exército de 500.000 homens. Depois da presa de Nicéia, apoderaram-se de Antioquia, penetrando em Jerusalém com a palma do triunfo.

Ali quiseram presentear Godofredo de Bouillon com a coroa de rei, mas o duque da Baixa Lorena parecia rever o vulto luminoso do Senhor do Mundo, cuja fronte fora aureolada com a coroa de espinhos, e considerou sacrilégio o colocarem-lhe nas mãos um cetro de ouro, quando o Cristo tivera, tão-somente, nas mãos augustas e compassivas, uma cana ignominiosa. Depois de muita relutância, aceitou apenas o título de "defensor do Santo Sepulcro", organizando-se logo em seguida as ordens religiosas de caráter exclusivamente militar, como a dos Templários e a dos Hospitalários.

Os turcos, porém, não descansaram. Depois de muitas lutas, apossaram-se de Edessa, obrigando o papa Eugênio III a providenciar a segunda Cruzada, que, chefiada por Luís VII da França e Conrado III da Alemanha, teve os mais desastrosos efeitos.

FIM DAS CRUZADAS. Em fim do século XII Jerusalém cai em poder de Saladin. Os príncipes cristãos do Ocidente prepararam-se para a terceira Cruzada, assinalando-se as vitórias de São João d'Acre. As lutas no Oriente sucederam-se anos a fio como furacões periódicos e devastadores. A Palestina possuía, até então, os seus recantos maravilhosos de verdura abundante. A Galiléia era um vasto jardim, cheio de perfume e de flores. Mas tantos foram os embates dos exércitos inimigos, tantas as lutas de extermínio e de ambição, que a própria Natureza pareceu maldizer para sempre os lugares que mereciam o amor e o carinho dos homens.

As últimas Cruzadas foram dirigidas por Luís IX, o rei santo de França que, depois da tomada de Damieta, caiu em poder dos inimigos, pagando fabuloso resgate e vindo a desprender-se da vida terrestre em 1270, defronte de Túnis, vitimado pela peste. Os mensageiros de Jesus, que de todos os acontecimentos sabem extrair os fatores da evolução humana para o bem, buscam aproveitar a utilidade desses acontecimentos dolorosos. Foi por essa razão que as Cruzadas, não obstante o seu caráter anticristo, fizeram-se acompanhar de alguns benefícios de ordem econômica e social para todos os povos.

Na Europa a sua influência foi regeneradora, enfraquecendo a tirania dos senhores feudais e renovando a solução dos problemas da propriedade, conjurando muitas lutas isoladas. Além disso, os seus movimentos intensificaram, sobremaneira, as relações do Ocidente com o Oriente, apenas paralisadas mais tarde, em vista da ferocidade dos turcos e dos invasores mongóis.

O ESFORÇO DOS EMISSÁRIOS DO CRISTO. No infinito, reunem-se os emissários do Divino Mestre, em assembléias numerosas, sob a égide do seu pensamento misericordioso, organizando novos trabalhos para a evolução geral de todos os povos do planeta. Lamentam a inabilidade de muitos missionários do bem e do amor, que, partindo dos Espaços, saturados dos melhores e mais santos propósitos, experimentam no orbe a traição das próprias forças, influenciados pela imperfeição rude do meio a que foram conduzidos.

Muitos deles se deixavam deslumbrar pelas riquezas efêmeras, mergulhando no oceano das vaidades dominadoras, estacionando nos caminhos evolutivos, e outros, como Luís IX, de França, excediam-se no poder e na autoridade, cometendo atos de quase selvajeria, cumprindo os seus sagrados deveres espirituais com poucos benefícios e amplos prejuízos gerais para as criaturas.

Mas, compelidas pelas leis do amor que regem o Universo, essas entidades compassivas jamais negaram do Alto o seu desvelado concurso a favor do progresso dos povos, procurando aperfeiçoar as almas e guiando os missionários do Cristo através dos mais espinhosos caminhos.

POBREZA INTELECTUAL. No século XIII estava definitivamente instalado o governo real, desaparecendo as mais fortes expressões do feudalismo. Cada região européia tratava de concatenar todos os elementos precisos à organização de sua unidade política, mas a verdade é que os meios escassos de instrução não permitiam uma existência intelectual mais avançada.

Os Estados que se levantavam, organizavam as suas construções à sombra da Igreja, que tinha interesse em não dilatar os domínios da educação individual, receosa de interpretações que não fossem propriamente dela. Os pergaminhos custavam verdadeiras fortunas e o livro era dificilmente encontrado. Até o século XII as escolas estavam circunscritas ao ambiente dos mosteiros, onde muitos padres se ocupavam de avivar a letra dos manuscritos mais antigos, produzindo outros para a posterioridade.

A Ciência, cuja linha ascensional guarda o seu ponto de princípio na curiosidade ou na dúvida, bem como a filosofia, que se constitui das mais altas indagações espirituais, estavam totalmente escravizadas à Teologia, então senhora absoluta de todas as atividades do homem, com poderes de vida e morte sobre as criaturas, considerando-se os direitos absurdos do Tribunal de Inquisição, depois do século XIII, quando, sob a inspiração do Alto, já se haviam fundado universidades importantes como as de Paris e de Bolonha, que serviram de modelo às de Oxford, Coimbra e Salamanca.

RENASCIMENTO. A esse tempo opera-se um verdadeiro renascimento na vida intelectual dos povos mais evolvidos do mundo europeu. A universidade se constituía de quatro faculdades - Teologia, Medicina, Direito e Artes - reunindo milhares de inteligências ávidas de ensino, que seriam os grandes elementos de preparação do porvir.

Rogério Bacon, franciscano inglês, notável por seus estudos e iniciativas, é um do pontos culminantes dessa renascença espiritual. A Igreja, contudo, proibindo o exame e a livre opinião, prejudicou esse surto evolutivo, máxime no capítulo da Medicina, que, desprezando a observação atenta de todos os fatos, se entregou à magia, com sérios prejuízos para as coletividades. Favorecida pela necessidade dos panoramas imponentes do culto externo da religião e pela fortuna particular, a Arquitetura foi a mais cultivada de todas as artes, em vistas das grandes e numerosas construções então em voga.

Com a influência indireta dos Guias espirituais dos vários agrupamentos de povos, consolidando-se as expressões linguísticas de cada país, formando-se as grandes tradições literárias de cada região.

TRANSMIGRAÇÃO DE POVOS. É então que inúmeros mensageiros de Jesus, sob a sua orientação, iniciam largo trabalho de associação dos Espíritos, de acordo com as tendências e afinidades, a fim de formarem as nações do futuro, com a sua personalidade coletiva. A cada uma dessas nacionalidades seria cometida determinada missão no concerto dos povos futuros, segundo as determinações sábias do Cristo, erguendo-se as bases de um mundo novo, depois de tantos e tão continuados desastres da fraqueza humana.

Constroem-se os alicerces dos grandes países como a Inglaterra, que, em 1258, organiza os Estatutos de Oxford, limitando os poderes de Henrique III, e em 1265 erige a Câmara dos Comuns, onde a burguesia e as classes menos favorecidas têm a palavra com a Câmara dos Lordes. A Itália prepara-se para a sua missão de latinidade. A Alemanha se organiza. A Península Ibérica é imensa oficina de trabalho e a França ensaia os passos definitivos para a sabedoria e para a beleza.

A atuação do mundo espiritual proporciona a história humana a perfeita caracterização da alma coletiva dos povos. Como os indivíduos, as coletividades também voltam ao mundo pelo caminho da reencarnação. É assim que vamos encontrar antigos fenícios na Espanha e em Portugal, entregando-se de novo às suas predileções pelo mar. Na antiga Lutécia, que se transformou na famosa Paris do Ocidente, vamos achar a alma ateniense nas suas elevadas indagações filosóficas e científicas, abrindo caminhos claros ao direito dos homens e dos povos.

Andemos mais um pouco e acharemos na Prússia o espírito belicoso de Esparta, cuja educação defeituosa e transviada construiu o espírito detestável do pangermanismo na Alemanha da atualidade. Atravessemos a Mancha e deparar-se-nos-á na Grã-Bretanha a edilidade romana, com a sua educação e a sua prudência, retomando de novo as rédeas perdidas do Império Romano, para beneficiar as almas que aguardaram, por tantos séculos, a sua proteção e o seu auxílio.

FIM DA IDADE MEDIEVAL. Do plano invisível e em todos os tempos os Espíritos abnegados acompanharam a Humanidade em seus dias de martírio e glorificação, lutando sempre pela paz e pelo bem de todas as criaturas.

Referindo-nos, de escantilhão, à nobre figura de Joana d'Arc, que cumpriu elevada missão adstrita aos princípios de justiça e de fraternidade na Terra, e às guerras dolorosas que assinalaram o fim da idade medieval, registramos aqui, que, com as conquistas tenebrosas de Gêngis Khan e de Tamerlão e com a queda de Constantinopla, em 1453, que ficou para sempre em poder dos turcos, verificava-se o término da época medieval. Uma nova era despontava para a Humanidade terrestre, com a assistência contínua do Cristo, cujos olhos misericordiosos acompanham a evolução dos homens, lá dos arcanos do Infinito.

EMMANUEL